Last updated on 10 de October, 2024
Agulhas de luz picotavam os vales sinuosos, avistavam-se procissões de olivais, sobreiros e pinheiros a desfilar até às águas turquesa do rio.
Na odisseia pelos Municípios do Douro, este Domingo atracamos em Alijó e lançamos a corda a mais quatro carimbos no Passaporte Douro. A Estação Ferroviária do Pinhão, a aldeia de Perafita e o Miradouro do Ujo já eram nossos conhecidos pelo que, começamos o dia a “carimbá-los” no Postos de Turismo de Alijó, que habita no edifício do Teatro Auditório Municipal. Aí, ofereceram-nos também o carimbo do Santuário de Nossa Senhora da Piedade que visitamos, pela primeira vez, neste Domingo. Antes disso, regressamos ao Trilho das Fragas Más: 11 Kms de êxtase, de sonetos de cores, de orquestras de sentidos; de toda uma arquitetura de contrates, de vitrais de curvas sinuosas que se despenham no rio azul-topázio.
O trilho começa no Jardim das Laranjeiras, em São Mamede de Ribatua, a 400 metros de altitude no qual podemos encontrar diversas estátuas de homenagem a trabalhadores locais da faina da vinha e da agricultura da região.
Seguimos a acompanhar o ribeiro que atravessa a freguesia, cumprimentamos a Ponte Romana e optamos pelo sentido recomendado, em direção a Safres. Cerca de 1,800 Kms após o início do trilho, chegamos à placa que sinaliza o “Miradouro do Ujo” – são menos de 200 metros de desvio para chegar a esta paisagem tão envolvente que engrandece a nossa condição humana. Daqui podem desvendar-se curvas de encostas vertiginosas forradas de bosques de sobreiro e carvalho, recortadas, em cima, pelo céu celeste, e, em baixo, pelas águas hipnotizantes do Tua.
Agulhas de luz picotavam os vales sinuosos, avistavam-se procissões de olivais, sobreiros e pinheiros a desfilar até às águas turquesa do rio.
Singramos por caminhos largos com troços pavimentados por calçada romana, fileiras de pinheiros muito aprumados a desvendar vales profundos que desabavam nas águas planas. Chegamos a Safres: vimos novelos de telhados cor de tijolo desenrolarem-se encosta abaixo, formas geométricas caiadas de fresco a contrastar com geometrias de granito cansado e o Santo António empoleirado numa trave de pedra na capela com o mesmo nome.
A partir daí, o trilho sobe sem piedade, tão árido como deslumbrante, e volta a descer, por estradas de areia fina impressas em cristas de vagas montanhosas debruçadas sobre o azul espelhado do rio. Imaginámos o que ali construiríamos, esculpimos projetos, lançamos ideias soltas e o nosso amigo Paulo foi atando as pontas. Porque é isso que os amigos fazem: desenrolam-nos quando encolhemos, desatam os nós que criamos e atam-nos as pontas. Pensei na Ana, uma colega que, dentro de poucos dias, vai deixar de trabalhar comigo: há pessoas que são como a corda da equipa: atam e mantém as peças de pé. A Ana tem sido, muitas vezes, a corda a que me agarro. Vai fazer-me falta. Continuamos em direção ao Miradouro das Fragas Más
O calor começava a entranhar-se nas células, a amarfanhar os pulmões, as mãos na anca empurravam as pernas pesadas, mas a envolvente continuava surpreendente a cada curva, com encostas exuberantes a exibir, ao colo, tons de verde e azul de um rio irreal.
Chegamos ao Trilho das Fragas Más: encostas férteis de um verde excêntrico a desabar nas águas de cor indizível do Tua que desliza como um réptil e se alarga até ao limite do visível.
Prosseguimos, já a acusar algum cansaço, esmagados por um calor opressivo. Apanhamos figos caídos, doces e espessos e fomos recompensados. Não que precisássemos de qualquer outra compensação que não a imersão nesta beleza extrema, mas cerca de 1,5 Km do fim do trilho, as águas da Ribeira de São Mamede de Ribatua, a romper de cascatas descontraídas, vieram convidar-nos a dar um mergulho. E nós acedemos!
Refrescados e deslumbrados, regressamos ao Jardim das Laranjeiras, literalmente, agarrados às cordas.
Antes de regressar a casa, fomos ainda visitar o Santuário de Nossa Senhora da Piedade, cuja Capela principal, construída no alto de um monte, abriga imagens da Via Sacra, esculpidas tão perfeitamente que comovem mesmo quem não é crente.
Missão cumprida, mais quatro carimbos e já a pensar no próximo município em que vamos amarrar a corda.
Ana
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